António Marques Bessa é Professor Catedrático no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas(ISCSP). No final de mais um ano lectivo, O DIABO entrevistou-o sobre a sua carreira e o estado actual da Universidade e do Ensino.
Duarte Branquinho – Há quantos anos é professor?
António Marques Bessa – Sou professor desde 1970. Fui saneado no processo de 74 e depois voltei.
Porque é que foi saneado?
Fui saneado porque entenderam que eu não era comunista e, como o ISCSP foi tomado por comunistas, fizeram processos contra toda a gente, como era habitual. Anularam-me com um processo de saneamento.(...)
Que alterações tem notado na Universidade ao longo da sua carreira?
Verifica-se de várias maneiras. Por exemplo, no facilitismo do sistema, não se pode chumbar ninguém. Pessoas com classificações de oito e nove valores fazem exame oral, pessoas com dez passam, mas encontram-se sem possibilidade de discuti-la em exame oral, ou seja, estão coladas à nota e só através de nova inscrição é que podem modificar essa nota. É claro que eu reprovo esse sistema.
Em relação às alterações provocadas pelo processo de Bolonha, acha que uma pessoa pode licenciar-se em três anos?
Não, não é possível. Uma pessoa, para ser um licenciado, precisa de pelo menos cinco anos. Eu só me senti maduro, no meu tempo, no quinto ano. Foi quando percebi o que era a Universidade. Percebi tudo nesse momento. Foi quando percebi que era necessário um quinto ano para maturarmos as ideias em Ciências Sociais.
Considera que os actuais mestrados são uma mera continuação da licenciatura?
Sem dúvida. No fundo, a licenciatura é agora feita nos mestrados. Quando se acaba um mestrado de hoje em dia tem-se uma licenciatura antiga.
E em relação aos doutoramentos?
Hoje até há um “curso de doutoramento”! Eu classifico isto como um esquema para as Universidades ganharem dinheiro. Um doutoramento é feito, na realidade, para que a pessoa se desenvolva nas suas próprias capacidades com um orientador que escolha. Hoje, isso não se passa assim.
Temos um Ensino “a metro”?
Hoje temos um curso superior que é metrificado e calculado.
Perdeu-se a selecção dos melhores?
A Universidade deixou efectivamente de ser a selecção dos melhorespara se tornar numa uniformização onde coloca todos.
Os alunos são piores?
Os alunos são cada vez piores. A preparação com que vêm dos liceus é cada vez pior e isso não vai chocar ninguém. É que os liceus também não têm outra possibilidade se não criar gente como criam e que chega às Universidades. Consequentemente, as Universidades, aceitam ou não aceitam, tratam ou não tratam essa gente e depois a colocam num nível em que ela devem estar, isto é, uma consciência de universitários com uma responsabilidade nova para outro nível de pensamento e outro nível de acção.
E em relação aos professores?
Vejo que muito professores se adaptaram ao sistema e acham que o sistema para eles, enfim, corre bem… Mas muitos outros não acham que correu bem e eu estou entre eles.
Como assim?
Este sistema é um sistema letal para a Universidade, para além das repercussões que terá na cultura portuguesa, o que será fatal. Está-se a criar imbecis que são iguais à classe política existente.
Deixou de haver no seu Instituto uma disciplina de cultura portuguesa. Como comenta?
Havia disciplinas de cultura portuguesa, mas foram abolidas. Acho inacreditável, sobretudo para pessoas que eram de um curso de comunicação social. Agora, não sabem nada de cultura portuguesa. Como é que podem ser grandes jornalistas ou grandes pessoas?
Isso nota-se na Imprensa de hoje em dia?
Com certeza. Mas não é só na Imprensa, é em todos os lados. São incompetentes, que não sabem nada do que é Portugal. Não sabem nada do que é a cultura portuguesa e opinam como se fossem americanos.
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É mais gratificante militar num dos partidos do arco do poder, colando uns cartazes e participar noutras actividades do partido do que "queimar as pestanas" a estudar. E quando chegar a uma posição de topo sem ter frequentemente qualquer experiência profissional, se desejar fazer um "upgrade" das habilitações académicas para satisfazer o seu ego, isso é coisa simples para gente influente e é já usual no nosso país, como tem sido noticiado ultimamente.
ResponderEliminarPor isso, em Portugal, criar verdadeiras competências em áreas produtivas só se tiver em mente a emigração, porque por cá há outras valências muito mais importantes para se subir na vida pública e até privada, porque muitos políticos saem diretamente para o topo de Empresas Privadas imediatamente depois de terem estado no Governo. Será que nessas empresas não há pessoal técnico altamente qualificado e com muitos anos de experiência a promover? Não! Um ex-político é a melhor solução (?)