"POR FAVOR NÃO DÊ MILHO AOS POMBOS
Não se espera que os chefes de clã das dinastias desapareçam de um dia para o outro. Mas temos, definitivamente, de deixar de dar milho aos pombos.
O feudalismo é um sistema de senhorio e vassalagem, em que os vassalos têm os deveres e os senhores têm os direitos. Grosso modo. Pensava que o sistema tinha sido abolido e na era do capitalismo democrático liberal éramos todos mais ou menos constitucionalmente iguais. Sendo uns mais iguais do que outros.
Há uns anos largos, li numa dessas revistas cor-de-rosa que desfolhamos com as mãos suadas do medo do dentista ou do tédio do cabeleireiro, uma entrevista a uma dama da “nossa melhor sociedade”. Era uma mulher antiga, restaurada por cirurgia plástica e alta manutenção, que se fazia retratar ao lado de jarrões chineses e cómodas francesas do século XVIII. O penteado, uma pompadour admirável na arquitetura e na escassez pilosa que deixava entrever espaços vazios e lugares onde nada crescia, ostentava uma cor ruça. A dama era um dos descendentes de uma das dinastias industriais e financeiras que há anos entretêm os portugueses com as suas histórias de riqueza. Benfeitores da humanidade. Na verdade, nós, os beneficiários, não fizemos mais do que dar milho aos pombos. Conhecem os cartazes: POR FAVOR NÃO DÊ MILHO AOS POMBOS. Os pombos, sobrealimentados, tombam por excesso. Não conseguem parar de comer. Não conhecem a saciedade.
A dama falava sobre a dinastia, a excelência da dita, o nome sonante da dita (um nome estrangeiro), a bonança de ter fortuna no tempo das tempestades, que por aqui equivaliam à revolução. Os horrores do exílio enquanto o país era tomado de assalto por barbudos.
Lá para o fim, pergunta-se o que pensa ela, refinadíssima, do mais refinado português da época, do comissário José Durão Barroso. Pelo tom da pergunta, um homem daqueles devia ter nascido parisiense. Elevava a lusitana plebe. Era tão bom que parecia estrangeiro. A dama tinha a melhor opinião, não do Barroso que não conhecia bem ou dos feitos europeus do mesmo. Não, o que a dama conhecia e lembrava era a família dele, uma família decente, remediada, virtuosa e bem comportada, que tinha trabalhado para a dinastia e, parece, trabalhado bem. Uma das pessoas da família tinha sido professora numa das escolas que a família construíra para os operários. Boa gente. Isto é dito com condescendência feudal. O que a dama queria dizer era que a família pequena era propriedade da família grande, como o resto do país. E que a família grande era boa para os seus trabalhadores e os educava.
Ou seja, a dama, como todos os pombos sobrealimentados, inchados de milho grátis, não conseguia falar sobre os outros e apenas sobre ela mesma, mas como ela mesma não tinha existência a não ser como herdeira e adereço de jarrões chineses, falava da dinastia. Tudo era um pretexto para realçar os dotes da dita.
Histórias destas, repletas de inanidades, abundam por aí. Perdoai-lhes senhor porque não sabem o que dizem. Embora saibam bem o que fazem, comprar serviços e vassalagens, porque o temor reverencial dos portugueses pelo poder e o dinheiro é atávico, ancestral, fundado na miséria, no isolamento geográfico e no capital genético com pouco cruzamento e pouco cosmopolitismo, apesar do império. A Europa não nos salvou do cobarde compromisso com a iniquidade que faz fraca a forte gente. E de maus reis ainda não estamos fartos. Havia a dama que queria ir “brincar aos pobrezinhos” numa barraquinha da Comporta, experimentando a delícia do chinelo de praia, e há outro senhor de grande porte que queria “pôr o Moedas a funcionar”. Saiu publicado nos jornais. Pôr o Moedas a funcionar. O Moedas era o político feito vassalo de ocasião, que os senhores com a mansão a arder esperavam lesto com a mangueira e o extintor. Por favor ao feudalismo falido. E junte-se a história da distribuição de dinheiros ilícitos do fabuloso negócio dos submarinos pelos chefes de clã da dinastia. Um milhão para o clã A, um milhão para o B, etc., e houve uns milhões que ficaram de fora porque um malandreco de um político teria resolvido dar-lhes uso (alegadamente, tudo alegadamente). O chefe da dinastia queixava-se de “estar rodeado de aldrabões”. Sem dúvida, sem dúvida.
Claro que esta gente tem um problema, participam da moleza genética de muitos casamentos entre clãs e antigas consanguinidades. O genoma não se renova por efeito da democracia. E, como aqueles cães com excesso de pedigree, sofrem de maleitas que nunca atacam os rafeiros. Uma delas é a estupidez do privilégio. A crença na divindade de dinastias plebeias fundadas por comerciantes e vendedores, os tetravós. Acham que o mundo não mudou porque eles não mudaram. Como os Bourbon, não esqueceram nada e não aprenderam nada. Talleyrand topou-os. Não se espera que esta gente desapareça de um dia para o outro. Mas temos, definitivamente, de deixar de dar milho aos pombos."
(by Clara Ferreira Alves in Revista/Expresso)
Leia ainda... exemplos de feudos
O Banco de Portugal, albergue dos senhores feudais? Vergonhoso
Os marajás de Portugal, sem pudores, só luxos
JÁ TODOS SABEM SÓ TU NÃO VÊS? SOMOS VITIMAS DE ROUBOS INIMAGINÁVEIS.
SE AINDA É DAQUELES CRENTES QUE ESPERA QUE DEUS NOS VENHA SALVAR... OU ESPERA QUE OS POLÍTICOS SE CONVERTAM EM AMIGOS DOS POBRES/POVO... TALVEZ SEJA MELHOR VER ESTE VIDEO E ACORDAR, POIS DE TANTO ESPERAR ACHO QUE MUITOS ADORMECERAM.
Os nossos sistemas financeiros foram raptados por uma geração de ladrões!
Somos vítimas de um roubo de proporções inimagináveis!
Boa Clara!
ResponderEliminarApaixonei-me
QUe os dedinhos nunca te doam, rapariga!
Gosto , não a entendo muito bem no seu programa na tv , parece ter medo , mas aqui revela-se desassombrada e combativa , faça isso também na tv....
ResponderEliminarEsta senhora por vezes tem dificuldade em ocultar que tem tendências para proteger um partido, o ps, por isso é preciso saber seleccionar o que ela escreve, pois nem sempre me parece isenta, ela apenas é desassombrada quando fala em geral ou do psd. Por isso é daquelas comentadoras, que temos que ser nós a filtrar.
EliminarNão é só com ela. O melhor conselho que podemos dar aos cidadãos portugueses é que aprendam a filtrar tudo o que lhes dizem e deixem de culpar os outros das proprias más decisoes. Acabar com o reggime do Salazar foi rápido; acabar com as corporações vai ser mais dificil, a começar na cabeça dos eleitores.
EliminarMas esta senhora parece ser a autora de um dos melhores artigos que conheço: http://apodrecetuga.blogspot.pt/2013/11/sem-justica-nao-existe-democracia-este.html. Não sendo perfeita de facto é uma senhora.
EliminarVejam só estas frases do artigo:
"Os portugueses, na sua infinita e pacata desordem existencial, acham tudo "normal" e encolhem os ombros".
"Este é um país onde as coisas importantes são "abafadas", como se vivêssemos ainda em ditadura". (A culpa é da imprensa que poucos criticam. O circo que temos na imprensa ajuda a abafar o que é importante)
"Continuamos sem saber nada, e esperando nunca vir a saber com toda a naturalidade". (Haja futebol e circo e lá está o povo contente)
--- Isto é do melhor que já vi ---
Claro não lhe estou a negar a qualidade e o mérito, apenas estou a dizer que é preciso separar o trigo do joio porque por vezes ela deixa-se levar e começa a defender o ps, mais do que normal e a isenção permitem.
EliminarNão dê milho aos pombos? E porque não eliminar o milho completamente? Se esses senhores "Lords" vivem do milho, retirando o milho, eles simplesmente desaparecem. Parece muito fácil? Não é o milho que faz o "World go round" é o nosso esforço, a nossa ingenuidade e os recursos que o nosso planeta tem para oferecer que fazem o "World go round". O milho representa a nossa escravidão puro e simples.
ResponderEliminarExcelente explicação da atitude do povo português perante os lordes. Estou a gostar deste blog cada vez mais.
Na minha opinião, não chega!
ResponderEliminarNa minha opinião, a 'malha do crivo' deve ser mais apertada!... Leia-se: o Direito ao Veto de quem paga!...