A punção fiscal e o destino do saque. A ilegitimidade dos governos.


O Estado é o beneficiário de uma relação única.
As pessoas são coagidas a entregar-lhe parte substancial do seu rendimento sem qualquer explicação credível ou especificação que denote a sua futura utilização; nem as pessoas têm qualquer intervenção sobre o seu destino concreto. 
O autoritarismo estatal verifica-se na recolha do imposto e na sua aplicação prática; não há uma relação bilateral, de direitos e deveres, apenas a perpetração de um saque.

As pessoas são consideradas tecnicamente como “obrigados fiscais” designação que expressa essa profunda desigualdade entre as pessoas e o Estado, dito representante de “todos nós”. Por isso, quem precisar de uma escola nas imediações, ao pagar os seus impostos, provavelmente terá o seu contributo “investido” num tanque de guerra, num pagamento de consultadoria, num banco em dificuldades ou em juros de dívida; e não terá qualquer via para contestar um gasto considerado inútil, excessivo ou um investimento não efetuado, mesmo se inscrito no orçamento.

A classe política sabe-se com poder para usar o dinheiro dos impostos como quiser. 
Sabe que pode gastar mais do que o que lhe foi entregue, contrair empréstimos, proceder a contratos ruinosos ou conceder benefícios fiscais, atribuir rendas e privilégios (incluindo aos seus próprios membros), sem qualquer mandato para além das votações genéricas do orçamento, efetuadas em sessões parlamentares teatralizadas entre membros da classe política. O espetáculo transforma-se em farsa quando se sabe que o orçamento é previamente aprovado (sem recurso) pela Comissão Europeia, enquanto a dívida pública ultrapassar os 60% do PIB, situação que, de modo otimista se sabe irá ter uma vigência de dezenas de anos.
Podem ainda referir-se as promessas feitas em campanha eleitoral que todos sabem (votantes e mandarins) ser uma encenação, cujo conteúdo todos irão esquecer ou, se necessário, revogado por algum estudo elaborado à medida ou outro subterfúgio, para justificar o não cumprimento do prometido.

O orçamento é efetuado sob a orientação do capital financeiro e dos grupos económicos com acesso ou controlo sobre os membros do governo, no sentido da obtenção de benefícios fiscais, da definição da carga fiscal ou contributiva sobre o trabalho, do volume destinado a apoios sociais, contratos, investimentos de “interesse público” - a financiar pela banca ou com adjudicação antecipadamente comprometida - e ainda concessões, privatizações ou aquisições de serviços e equipamentos. O interesse público até poderá estar contido em algumas das prescrições orçamentais concretas mas, no seu conjunto, o orçamento não é construído tendo como primeiro objetivo o interesse coletivo. Como popularizado pelo actual primeiro-ministro, a chegada ao governo visa o acesso ao “pote”, onde continuamente se derrama o dinheiro dos impostos.

A garantida continuidade do fluxo financeiro imanente à punção fiscal é também uma situação única. As pessoas nascem e morrem e as empresas podem falir. O Estado, por muitas dificuldades financeiras que tenha, não vai à falência; tem sempre como suporte, susceptível de saque, o património e os rendimentos da população.
Um contrato em que o Estado figura como devedor é uma maravilha para os credores. Primeiro, porque o domínio ou a influência do capital financeiro e dos grupos económicos ou nativos sobre a classe política garante condições muito favoráveis (com maior ou menor envolvimento de corrupção), como se observou recentemente em Portugal com os contratos swap e as parcerias público-privadas. Depois, porque a presença da classe política no exercício da punção fiscal garante que os contratos serão cumpridos, quer porque os credores nele incluem formas de evitar deslizes, como se disse atrás ( a) O aparelho coercivo) e ainda beneficiam da supervisão estratégica da UE, do BCE ou a mais operacional como a da extinta troika. E finalmente porque os mandarins, em regra, por obediência aos seus mandantes, tratam de dirigir o esforço financeiro para os trabalhadores e o população pobre, poupando no possível as empresas e os empresários, enquanto entes superiores, porque criadores de emprego e riqueza, como consta nos salmos repetidos pelos media.

Qualquer transformação política radical que contemple o não cumprimento por parte de um país, este, para se furtar ao ostracismo e sanções do capital global ou é um país de grande dimensão com relevância própria ou inclui a sua atuação num concerto de povos de vários países acossados, susceptível de promover perturbações graves nos mercados financeiros, tão agressivos e dinâmicos quanto frágeis.

3.3 – A ilegitimidade ontológica do Estado
Nada disto se prende com a atividade de um gang específico na condução do aparelho estatal; jamais qualquer oposição de direita ou da esquerda institucional fará algo que seja substancialmente diferente, uma vez que os partidos do sistema capitalista e de democracia de mercado estão formatados para viver dentro do sistema e do sistema.
Em suma, a gestão financeira corrente do Estado é portadora de uma ilegitimidade gritante, porque a sua existência não visa o bem-estar da população; em Portugal ou qualquer outro país.A ilegitimidade do Estado pode ser observada sob vários pontos de vista.

Há uma ilegitimidade basilar que é a existência de um aparelho que se auto-reproduz, portador dos poderes de exercício de autoridade, de coação e de repressão sobre as pessoas, que toma, implicitamente, como seus súbditos. A apropriação daquele aparelho pela classe política, promove a sua fusão com o próprio Estado, tornando-se regra a existência de partidos-estado, mesmo quando formalmente surgem em eleições, como distintos. A relevância principal da classe política, do ponto de vista do sistema capitalista, resulta de ser o consignatário do capital financeiro, das multinacionais e do capital nativo, sem descurar os interesses pessoais ou grupais dos seus membros. Outra das suas mais relevantes funções é a da perpetuidade do sistema e da sua própria como classe, que designam de modo simpático por “estabilidade política”, assente no convencimento da multidão sobre a bondade da organização política que mascara a geral ausência de democracia.
Como já dissemos atrás, a classe política toma também decisões que satisfazem necessidades da população mas, não é esse o seu principal objetivo; este consiste na sua própria reprodução como corpo privilegiado pelo acesso e distribuição do conteúdo do “pote” o que convém também aos capitalistas que têm influência nos mandarins.

Uma das ações desse corpo privilegiado, especificamente, da classe política, consiste em organizar eleições - no caso das chamadas democracias representativas – para a escolha dos seus membros que irão decidir sobre as necessidades coletivas da população.
Esses eleitos, jamais considerarão a hipótese de colocar a população a tomar decisões concretas; e, menos ainda a vincularem-se a elas, a tomarem-se como mandatários da população, que teria, naturalmente, o direito de revogar os seus mandatos, a qualquer momento, num contexto de não perpetuidade da representação numa classe política – o que se chama democracia direta.

A adopção da democracia direta significaria a vacuidade do Estado, como detentor da autoridade o que arrastaria a evidente percepção da inutilidade da classe política.
Recorde-se a dificuldade de se organizarem referendos de iniciativa popular, sendo todos, os poucos efetuados em Portugal, da iniciativa do poder. Abordámos recentemente a construção legislativa com que a classe política portuguesa se defende da realização de referendos por si não desejados[11].
O Estado e os seus donos geram, em permanência uma cultura de obediência à sua figura, segmentações e desigualdades sociais e económicas entre a população, como um deus exigente e caprichoso, acima das pessoas, incluindo nessa cultura a afirmação e a promoção de uma menoridade natural que o povo terá. A desinformação introduzida por essa cultura é tanta sobre o que será a democracia que há quem diga: “o Estado, somos todos nós (os elementos do povo)”.

A democracia representativa, teorizada por Max Weber como a única forma admissível nas sociedades modernas, resume-se ao método de escolha dos mandarins, não à prática social da democracia, da decisão coletiva exercida pelos seus diretos interessados. Ao assumir essa posição elitista, Weber não só legitima a existência de um ente, o Estado, exterior e acima da população, como considera aquela, marcada pela ignorância, pela pusilanimidade, pela irresponsabilidade de resolver os seus próprios problemas. E legitima a existência de um escol, uma classe política para, na acepção mais lisonjeira, gerir e decidir paternalmente a favor da ignara plebe; o que equivale, para o leninismo e seus derivados, à vanguarda operária que, ungida pelos deuses, haverá de conduzir o resto do povo à glória, apropriando-se, de permeio de privilégios e rendimentos a que os não-ungidos não têm o direito.

A aplicação das leis emanadas do Estado defende menos os interesses das pessoas comuns, acometidas com sobranceria, com coimas, custas e juros enquanto “obrigados fiscais” do que empresas e capitalistas, beneficiários da permissividade que permite a evasão e o subterfúgio de anulações ou prescrições de dívida ao Estado ou à Segurança Social[12].
Por outro lado, as polícias podem reprimir atitudes criminosas mas, quantos deles resultam das disfunções produzidas pelo capitalismo, pelas desigualdades, pelo desemprego, pelos anátemas sociais, pela insegurança e pela miséria?
Porque não serão justiçados políticos responsáveis por actos lesivos para milhões de pessoas e é preso um simples carteirista apanhado no Metro? Ou um chamado empresário que despede trabalhadores, no seguimento agredidos com o anátema e a humilhação, por parte da classe política que lhes “concede” um subsídio?

Em Portugal, a carga fiscal direta sobre a população não possidente (IVA e IRS, na sua grande parte) ou indireta, porque repercutida nos preços finais pelas empresas (impostos sobre os produtos petrolíferos, sobre veículos, entre outros) é de longe superior à sua parte no rendimento nacional (44.8% em 2013); o que revela o caráter regressivo do sistema fiscal e que o Estado é um instrumento claro de recriação sistemática de desigualdades e injustiças. Como isso não é um elemento ocasional mas, uma caraterística que lhe é imanente, o Estado situa-se em contínua oposição e agressão à multidão, reduzindo-lhe a qualidade de vida que poderia gozar como resultado do esforço dos trabalhadores, coartando-lhe direitos, exigindo sacrifícios, no sentido de suprir os desequilíbrios financeiros que a classe política e o capital geraram para alimentar o processo de acumulação capitalista, em crise.
Nada disto se prende com a atividade de um gang específico na condução do aparelho estatal; jamais qualquer oposição de direita ou da esquerda institucional fará algo que seja substancialmente diferente, uma vez que os partidos do sistema capitalista e de democracia de mercado estão formatados para viver dentro do sistema e do sistema.
Em suma, a gestão financeira corrente do Estado é portadora de uma ilegitimidade gritante, porque a sua existência não visa o bem-estar da população; em Portugal ou qualquer outro país.

A introdução entre as responsabilidades do Estado, no que concerne a serviços de saúde e educação (entre outros) destinados a toda a população, representou a colocação no Estado de grandes responsabilidades na geração de bem-estar das populações. E daí, alguma legitimidade por um lapso de tempo que terá durado cerca de um século, desde a tomada de medidas para mitigar o sofrimento e elevar a esperança de vida dos trabalhadores industriais, em meados do século XIX e a década de 70 do século passado, com o capitalismo neoliberal iniciado com a experiência fascista no Chile e com Thatcher e Reagan.

Porém, o domínio da praga neoliberal na gestão do capital alterou as coisas, colocando nas empresas o exclusivo das responsabilidades na produção de todos os bens ou serviços, em concorrência, esperando-se que o deus mercado garanta a qualidade conveniente por um menor custo. E nessa lógica, a produção de batata frita terá a mesma universalidade e dignidade social de um serviço médico ou de uma escola, medindo-se todos pelos critérios da produtividade, da rendabilidade, da eficiente combinação de recursos que é atribuída, por axioma, ao mercado. Neste contexto, a criatividade neoliberal vai-se expandido para as áreas infraestruturais tão sociais como os transportes, no âmbito dos quais o ditoso mercado necessita do encaminhamento de fundos públicos para as empresas concessionadas, sob a forma de indemnizações compensatórias, em acumulação ou não com aumentos de preços; mesmo que isso incentive à utilização de transporte próprio, irracional em termos ambientais e estritamente económicos de custo social. O mesmo sucede no caso da captação e distribuição da água cujo principal efeito é, em regra, um forte aumento dos preços com o corte do abastecimento em caso de dificuldades económicas das pessoas. O equivalente sucede na saúde ou na educação, áreas em que a introdução das empresas no circuito é imposta à esmagadora maioria da população, tendo como base um menor financiamento público direto, compensado, por transferências para as empresas, de custos com a utilização de serviços privados, apelativos dado o desinvestimento público. Fala-se do modelo da “livre escolha” que permite a viabilização de negócios privados com dinheiro público ou o onerar da população com os custos do recurso a escolas, clínicas privadas ou seguros de saúde, estes últimos, peritos na arte de empurrar para o serviço estatal, patologias de tratamento prolongado ou oneroso. O modelo das parcerias público-privadas é mais uma criação neoliberal de favorecimento de grupos económicos poderosos e dos bancos cujos contratos com o Estado permitem-lhes beneficiar de vultuosas rendas.

Seria lógico que a população, ao suportar diretamente junto de empresas privadas, os custos de grande parte dos serviços antes pagos através da tributação fiscal, visse a punção fiscal reduzir-se. Mas não é isso que acontece, nomeadamente porque o endividamento dos Estados é grande e perpétuo, permitindo verdadeiras rendas ao capital financeiro, para além das tradicionais benesses aos capitalistas autóctones, sempre a clamar por ajudas que mantenham a sua competitividade.

O capital financeiro, como credor, zela pela segurança dos reembolsos (a longo prazo garantida dada a perpetuidade dos Estados, com a sua multidão de “obrigados fiscais” como forçado amparo); e sobretudo pelo regular municiamento dos juros que se vão vencendo. Como credor trata de supervisionar as contas do devedor utilizando instituições supranacionais (Comissão Europeia, BCE, FMI) para garantir esse pagamento, orientando em seu proveito, a aplicação do dinheiro dos impostos.

O instrumento essencial para esse processo de desnatação é o saldo primário, que espelha a diferença entre receitas e gastos públicos, de funcionamento ou investimento, excluídos os encargos com a dívida. Essa diferença, que se pretende positiva (excesso de receita) será afecta ao pagamento de juros de dívida; se não for suficiente para tal, o capital financeiro e as suas referidas instituições delegadas tratam de estudar o instrumento mais adequado para aumentar aquele saldo, impondo as suas escolhas ao governo - aumentar impostos, privatizar empresas ou reduzir gastos, com cortes salariais ou em pensões, despedimentos e reduções de encargos com a saúde ou a educação, manutenção de vias públicas, etc.

O saldo primário é um indicador essencial de domínio do capital financeiro e é um barómetro da subordinação dos países com todos os inconvenientes para a população, empobrecida, reduzida nos seus direitos, com dificuldades de encontrar trabalho e mesmo de se reproduzir, caindo na degradação social, do espaço público e do ambiente. A mesma população sofre, em acumulação, a pressão ascendente da punção fiscal e a redução dos serviços que aquela deveria pagar ou a sua passagem para meros serviços mercantis. Sendo assim, o Estado tende a reduzir substancialmente a suas funções de utilidade social e perde a sua legitimidade enquanto proclamado zelador da satisfação das necessidades coletivas.

E daí a defesa (e a saudade) de muitos, pelos tempos de vigência do modelo social europeu, mesmo na versão limitada que foi ensaiada em Portugal. O tempo não volta atrás nem a História se repete; falta à multidão a criatividade e a mobilização para construir uma fórmula de organização social que não contemple uma instituição denominada Estado, em constante depenação pela classe política, nem a presença de capitalistas em qualquer fase do processo de satisfação de necessidades.

O capitalismo pode viver com a acumulação protagonizada pelo Estado, dirigido por uma classe de burocratas, com um papel secundário para as empresas privadas. Porém, mesmo no capitalismo mais concentrado, globalizado e centralizado como o de hoje, a acumulação não pode dispensar a prestimável contribuição do Estado, mesmo reduzido à sua função coerciva e de punção fiscal que legitima, através da autoridade, a redistribuição regressiva do rendimento e da riqueza da população a favor dos capitalistas. Por outro lado, não pode existir uma sociedade só com capitalistas e mandarins, com robots e sem trabalhadores mas, pode certamente ser construída uma sociedade com pessoas utilizando todos os seus recursos tecnológicos e de conhecimento para reduzir o tempo e o esforço produtivo; sem que se sinta a falta de capitalistas e de políticos.

(...) Uma vez que não existe uma esquerda anticapitalista e autogestionária, quem se afirma de esquerda apresenta, em regra, pendores autoritários e hierárquicos, com propensões vanguardistas de controlo do povo e da movimentação social, de aceitação da democracia de mercado e do seu jogo, quando não taras nacionalistas de isolamento identitário e um saudosismo face às experiências do “socialismo” - ocultando o seu caráter de capitalismo de estado. Quem se clama dessa “esquerda” repetimos, não passa de um acessório da direita para proceder à gestão política e social da grande massa da população, a favor do capital.
Esses acessórios que apostam na credibilização da inutilidade institucional, com benefícios próprios bem fornecidos pelo Estado - gordos fundos e excepcionais direitos muito para além do que cabe à multidão - não passam de fantasmas, coloridas imagens holográficas que enformam uma falsificação da realidade e vocacionados para adiar ou subverter os anseios emancipatórios da plebe. 
[11] portugal-deve-sair-do-euro-sim-ou-nao
[12] -divida-seguranca-social-o-longo.html 

 
Poderá ler o artigo completo e conhecer mais sobre este tema da ilegitimidade do estado e do saque aos impostos, perpetuado por todos os partidos do sistema, neste link: GraziaTanta

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